Confesso que às vezes acho que me encontro vivendo dentro do
livro “Alice no país das maravilhas”,
de Lewis Carol. Não acho que toda aquela loucura poética e filosófica, que me
causava medo quando criança – claro, pois o livro é para adultos – fosse pior
do que viver, ou melhor, pagar pena, numa sociedade capitalista.
Nos dois governos neoliberais de FHC, a tirânica e malvada
Rainha de Copas era nossa desgovernanta. Pobre Rainha, tão inocente! Por aqui
não tínhamos sequer um Rei de Copas, infelizmente.
A Rainha, com seu modo de governar, lembra muito o nosso
sistema judicial atual, pós-ministros justiceiros, muitas vezes mimados, outras
tantas chantageados, pela grande imprensa: determinar
a culpabilidade o mais rápido possível: Culpados! Cortem-lhes a cabeça! Antes
dos ritos processuais, antes da defesa, antes do veredito, da sentença.
Invertendo
o brocardo jurídico de que “ninguém é considerado culpado antes de sentença
transitada em julgado”, para: “é culpado, por que assim afirmamos, assinado, o
PIG”.
As medidas arbitrárias daquela época, agora no país Brasil do
“esqueçam o que escrevi”, com a venda de nosso patrimônio material e
intelectual de nossas estatais aos financistas internacionais e nacionais, em
nome do “Consenso” de Washington, foi o maior crime já perpetrado contra o
nosso país, a nossa nação, o nosso povo. A Rainha de Copas era incapaz de tanta
bandidagem.
Não só o escândalo da Vale do Rio Doce, vendida por menos de
5% por cento do seu valor real, o que numa verdadeira democracia, uma
democracia consolidada, teria, no mínimo, levado FHC e seu séquito a prisão,
senão a pena de morte, pela traição, crime de lesa pátria e lesa humanidade
praticados contra a nossa nação.
Lembro-me da marretada do STF quando, contra a Constituição
Federal, apreciou a inconstitucionalidade da Lei nº 9.478/97, julgando-a, para
espanto do mundo jurídico, constitucional.
Abrindo um parêntesis, e tentando ser justo, o que é extremamente
difícil e raro, FHC foi muito, mas bota muito nisso, mais competente do que
Lula na indicação para a procuradoria geral da união e para os assentos de
ministros do STF, ninguém pode negar tal fato, a Lei nº 9.478/97 esta aí,
válida, para provar o dito.
O Brasil era um desastre anunciado, nada poderia mudar seu
rumo ao precipício, não havia esperança, foram oito anos de desespero.
No plano internacional havia ainda mais dois ídolos do
neocons nacionais e importados, Menen, que faliu a nossa irmã Argentina e a “lenda”
Fujimori, que roubou o povo peruano por dez anos, e era apontado, por todos os
áulicos neoliberais, como um exemplo, pomposo, a ser seguido e imitado, de
administrador do futuro.
Aí de quem na época criticasse Fujimori e seus clones, FHC e
Menen, pois éramos tidos como burros, parvos, comunistas frustrados,
dinossauros, e outras coisitas mais.
Lembro-me quando fazia mestrado na UFPE e uma professora, de
didática do ensino superior, se não me engano, dizia que Marx estava morto e
enterrado; outro, este de ciências políticas, era mais babão da política
externa dos EUA do que a Veja.
Findei não concluindo o mestrado por várias razões:
1)
Timidez.
Sempre entrava em pânico quando tinha que ministrar alguma aula;
2)
Pelo
conteúdo conservador do programa;
3)
Por
motivo de doença, tive depressão;
4)
Pelo
fato da grade curricular ter mais ou menos 50% de matérias ligadas à
administração, o que eu detesto.
O item três foi o que realmente mais pesou na minha decisão. Tive
depressão, a doença estava ligada ao fim do meu terceiro casamento, que se
consumou em setembro de 2002; ao fato de minha filha mais velha ter um
diagnóstico positivo de câncer na tireoide – hoje ela está mais linda e mais
saudável do que nunca; e, em terceiro lugar, a um professor, de uma cadeira
ligada às ciências contábeis, de nome Miranda, que se auto intitulava um
torturador.
Em aula, era um péssimo professor, diga-se de passagem, fazia
apologia à tortura, e aquilo me causava um dano emocional tremendo. Minha
vontade era de dar um murro na cara do sujeito e jogá-lo da janela do prédio da
SUDENE, décimo e não sei quantos andares abaixo. Mas como não nasci com os ovos
roxos de Collor, nem para ser assassino de um ser insignificante, resolvi
desistir. Tal fato foi a gota d’água para minha desistência.
Com Menem e Fujimori finalmente desmascarados e presos, acreditávamos
que FHC teria o mesmo destino por aqui. Infelizmente erramos feio.
Além do governo Lula não ter revisado os processos das
privatizações, ou doações do patrimônio público a uma corja de bandidos de
gravatas, como prometeu, calou-se de maneira covarde quanto à venda, digo, a concessão
não onerosa da Vale.
A Lei nº 9.478/97 continuou valendo, firme e forte, nem
sequer foi questionada junto ao STF, talvez pela certeza de um resultado negativo,
contra o povo, em virtude das indicações equivocadas, e displicentes, de
ministros para o STF, pelo governo trabalhista, ou qualquer outro interesse,
que não consigo entender, ou me recuso a admitir.
Um dos momentos mais tristes deste período foi o massacre dos
guerrilheiros Tupac Amaru, no Peru, que haviam invadido a embaixada do Japão, e
num gesto de incrível condescendência, liberto a mãe do então golpista e
ditador Fujimori.
Os guerrilheiros foram fuzilados, sem nenhuma resistência,
pelas forças armadas peruanas, que, na invasão para a retomada da embaixada,
ainda mataram dois ou três reféns, como noticiou a imprensa à época. Os
terroristas do Tupac Amaru não foram responsáveis por nenhuma morte.
Na mesa de bar de Seu Hélio, ou no Copo Sujo,
dois bêbados, eu e meu amigo Pena Branca, sempre chorávamos ao relembrar este
episódio. Em regra, a trilha sonora era composta por “Moon River”, de Henry Mancini e Johnny
Mercer; e de “Menino Passarinho”, de Luiz
Vieira: no violão de Pena Branca, na voz de Itárcio, e no desejo inconsciente
da humanidade em busca da alegria, da solidariedade e da paz.
Tempos ruins aqueles! Tempos ruins se
aproximam! Saudades da Santa Madre União das Repúblicas Socialistas Soviéticas!